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Entrevista Smohalla

A ARTE DA REGENERAÇÃO
“A vida e a música perfeita nunca vão existir”

Como deveria ser em qualquer forma de expressão artística, os Smohalla são uma terapia e um foco de sensações altruístas criadas reciprocamente entre o seu autor e o mundo. São estes os princípios de Slo, multi-instrumentista e compositor, que criou o seu próprio projecto em 2006 no calor de um underground francês cada vez mais surpreendente. Em Outubro passado, pelas mãos da ucraniana ARX Productions (a mesma que editou os açorianos A Dream Of Poe), lançou o seu álbum de estreia, “Résilience”, e promete catalisar o black metal de orientação ambiental e progressiva. Aliás, Slo referiu a importância das raízes mas diz que “o mundo tem que continuar a girar”, e nem se revê nos clichés do face painting, nem na mensagem negativa de Varg Vikernes.

Apesar de trabalhar com um colega, os Smohalla são um projecto a solo. Será esta uma forma mais fácil de alcançar a ambiência que visiona na sua mente?
Os Smohalla são um projecto muito importante para mim, a minha forma de expressão e criar na Terra. Porém, desde o início que estou aberto a experimentações e contribuições externas. O A.L. cria algumas partes electro-industriais desde o nosso primeiro lançamento. O Camille gravou e compôs algumas partes de guitarra e voz. Na verdade, temos uma série de convidados neste álbum e no EP “Nova Persei”. Sinto que tenho algumas bizarrias interessantes para partilhar. Esta banda é uma parte de mim e ajuda-me bastante.

Isto leva-o a ter que substituir músicos por programações?
As partes electrónicas e as batidas são, naturalmente, programações. A bateria foi gravada no estúdio de um amigo e as guitarras, vozes e teclados na minha casa no meu computador old school. Para este álbum tudo precisou de bastante tempo. Era necessário fazer as gravações e os arranjos no meu quarto num total ambiente de introspecção e sem limites de prazos e experimentações.

O que decorreu desta introspecção? Algo muito negativo?
Não vejo muito negativismo neste disco, mas penso que toda a gente pode interpretá-lo à sua maneira. Na minha opinião, os ambientes que se ouvem aqui são uma mistura de acepções, decepções, nojo, alegria, sonhos, vontade de viver e de superação. Eles dão-me força quando estou em baixo, fazem-me viajar para longe da “jaula” que se pode tornar o meu corpo ou o meu apartamento. Apaziguam-me. Por isso, acho este disco muito variado. Penso que não existe apenas uma emoção ao longo dos temas. Trata-se mais de uma mistura entre confusão e imaginação.

O que significa Smohalla? Tanto quanto sei trata-se de um profeta do séc. XIX associado ao movimento “Dreamers”...
Pedi-lhe emprestado o nome. [risos] Espero que onde quer que esteja a sonhar que não tenha problemas com isso. Ele é um grande símbolo para mim. Não vivemos na mesma terra nem no mesmo tempo, mas partilho muitos dos seus princípios.

A sua música move-se no sentido progressivo do black metal. Em primeira instância, acha que os fãs mais conversadores compreendem-na ou consideram-na uma espécie de heresia?
De um certo ponto de vista, o black metal está morto há 15 anos. Porém, como qualquer outro género, abriu imensas portas e é surpreendente como as pessoas o podem assimilar e personalizar. Portanto, parece-me claro que não nos podemos considerar uma banda de black metal, pois não o somos mesmo ainda que usemos a sua linguagem. Comecei a ouvir metal black metal e metal extremo quando tinha cerca de 12 anos. Agora tenho 28… faz parte da minha vida. Logo, o que os fãs mais conservadores pensam é, provavelmente, a última coisa que me preocupa e estou certo que eles também não se preocupam comigo.

A França está a tornar-se um autêntico viveiro de bandas de talento dentro do black metal. Como explica este cenário? Será que a Noruega está a perder a sua preponderância?
Sim, agora é a nossa vez! [risos] A França tem bandas de black metal desde o início dos anos 90. São exemplos os Gorgon, Blessed In Sin, Mutiilation, Vlad Tepes e muitos outros. A partir daí, nunca parámos de produzir bandas interessantes no campo do metal extremo. Poderia ainda referir os Supuration, Forbidden Site, Proton Burst, Forest Of Souls, Elend, Blut Aus Nord, Yyrkoon e Kalisia. Até as editoras saídas de França são importantes desde essa época, nomeadamente a Holy Records, a Osmose Productions, a Adipocere e a Season Of Mist. Há também uma série de bandas estrangeiras fantásticas que assinaram com selos franceses, como os …And Oceans, Oxiplegatz, Bethzaida e Anata. Perante isto, é fácil concluir que a cena francesa está muito mais exposta e é muito mais popular actualmente.

E com tudo isso, há algum tipo de rivalidade entre bandas?
De maneira alguma. O pouco pessoal com quem contacto e que faz parte de bandas é todo impecável. Refiro-me aos Sael, Pryapisme, Way To End, Immemorial e Hky. Ajudamo-nos todos sempre que possível, trabalhamos juntos… Como vêem, não há nenhuma rivalidade, competição, união estúpida ou falsa, nem mesmo princípios comuns. Apenas ouvimos e tocamos música com uma forte vontade de descobrir novas dimensões. Partilhamos também alguns gostos e usamos a mesma linguagem, o que ajuda muito.

Quais são as suas principais influências?
O “prisma” anónimo e todas as formas cegas que percorrem e dançam nas nossas cabeças.

Tanto quanto sei, nunca apresentou os Smohalla ao vivo. Como será se isso tiver que acontecer?
De facto, nunca tocámos ao vivo e, para dizer a verdade, não sei isso acontecerá.

Apesar de mencionar atrás que não se preocupa com a opinião dos fãs conservadores, como é a sua relação com os críticos? Será que não lhe geram qualquer tipo de pressão porque o objectivo é, sobretudo, ser independente, tocar música alternativa e permanecer no underground?
Pressão? Nunca, pelo menos com a minha música. Como dizia, este projecto faz parte de mim, representa algumas das minhas caras transformadas em música. Sou independente e algo estranho no meu dia-a-dia, nem gosto de sentir a atenção das outras pessoas. Às vezes sinto-me simplesmente como um fantasma e gosto disso. Já agora, sublinho que escolhi expressar-me de forma confidencial com um tipo de música que talvez apenas um ou dois por cento da população possa admirar. Aliás, não se trata de uma escolha, de uma vontade de nos tornarmos a banda mais oculta que existe, mas sim, e apenas, de tocar e gravar a música que gostamos de ouvir. Devido ao nosso estilo, mesmo que alguém se erga do underground e se torne popular, continua a ser underground. Sabemos que nunca viveremos como estrelas porque continuaremos a ter o nosso trabalho e ninguém nos irá reconhecer e saudar na rua. E isso, lembrem-se, mesmo que sejamos considerados uns reis para os tais um ou dois por cento. Por isso, não existe qualquer pressão.

Entende que o conceito tradicional de black metal é obsoleto?
Qual é o conceito tradicional de black metal? Mesmo que se viaje 15 anos atrás e se fale com algumas pessoas, perceber-se-á que, até naquela época, não havia consenso sobre esse assunto. O que será o verdadeiro e o falso black metal? Será que o black metal tem que ter letras satânicas? Se tiveres teclados nos teus álbuns significa que és falso ou gay? Simplesmente não me importo. Música é música. Desde novo que penso desta forma. Estava interessado, exclusivamente, com a música e com as letras, quando, raramente, eram interessantes. Ria-me com as pinturas faciais e todo o folclore à volta disso. Sei que fazem parte da história, mas é um aspecto que não me interessa. Sou do tipo que gosta imenso da música dos Burzum mas que acha o Varg Vikernes um safado que transmite ideias perigosas aos putos influenciáveis. Algumas delas até podem ser interessantes e legítimas… no papel. Outras são simplesmente “divertidas”, de uma maneira negativa. O mundo está em constante mudança e até explodir continuará a mover-se. A vida é movimento, evolução. Isto não significa que as mudanças continuem a representar coisas positivas. Todas as gerações têm as suas próprias doenças e problemas irresolutos. A vida perfeita, tal como a música perfeita, nunca vão existir. Todavia, não acho que seja possível encontrar soluções num passado idealizado que nunca vivemos. Portanto, se para muitos o black metal parou em 1993, então esses que continuem a ouvir os trabalhos daquele tempo ou a criar bandas com o espírito old school que tanto procuram. Não peçam é para o mundo parar de girar. O black metal é como a música country, o hip hop, o jazz, o rockabilly ou qualquer outro estilo. O seu período de nascimento está morto, mas sempre haverão bandas a tocar black metal, quer dentro dos parâmetros tradicionais, quer experimentais ou então dentro de ambos.

Relativamente ao vosso futuro e uma vez que não pretendem apresentar-se ao vivo, estarão já a escrever um novo disco?
Exacto, estamos a trabalhar num split com os Omega Centauri a editar em 2012. Da nossa parte vão estar três temas muito abrasivos, uma espécie de metal extremo moderno e épico. Ainda há a possibilidade do “Nova Persei” ser reeditado em digipack com dois temas extra, também no próximo ano.

Nuno Costa

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