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Ao vivo - October Loud/Dia 1

OCTOBER LOUD/DIA 1
26.10.07 - Neurolag/Nableena/In Peccatum/Zymosis - Salão de S. José, Ponta Delgada

O passado dia 26 de Outubro, primeira etapa do debutante festival açoriano October Loud, deixou no ar muitas reflexões quanto ao estado actual da música de peso nos Açores, mais concretamente em S. Miguel. A coragem com que este festival se tentava impor nesta fase do ano em que as actividades neste campo são praticamente nulas era um sinal de louvor à partida e o cartaz que apresentava era também mais do que aliciante para obrigar a que a comunidade de peso micaelense se reunisse em massa no Salão de S. José, em Ponta Delgada.

A começar pelos horários, a organização cumpriu à risca aquilo a que se comprometeu. Quanto ao som, ia melhorando gradualmente e a partir de certa altura pouco se sentia os efeitos adversos da acústica da sala e o público… este não foi assim tão pontual, mas assim que soaram os primeiros acordes da primeira banda, os Neurolag, registaram-se imediatamente as primeiras “movimentações” [entenda-se, mosh]. A surpresa podia não ser grande por vermos um público a entregar-se completamente ao som groovy, balançado, potente e, agora, mais técnico dos Neurolag, pois já lhes é reconhecida a força em palco e o grupo de seguidores que são sempre incondicionais a prestar-lhes apoio. A verdadeira surpresa revelar-se-ia aos poucos, ao longo da noite. Mas já lá vamos. Com um Hugo Pimentel cada vez mais demolidor na forma de vociferar os temas deste quinteto, acabou por ser a nota mais positiva da actuação dos Neurolag, atendendo a que o resto da banda levou algum tempo a se soltar, ainda assim nunca atingindo o grau de entrega de outras ocasiões. Relativamente ao alinhamento do seu concerto, teve, como era de esperar, base nos temas do seu primeiro trabalho – “Perception, Memory, Cognition” -, havendo ainda tempo para estrear “4 The Broken Mind”. Percebeu-se com este que a banda está a mudar e a alimentar uma forma mais complexa de compor.

De seguida, esperava-se já que se gerasse o maior tumulto, dentro e fora do palco. Era hora dos Nableena subirem ao palco, banda que não precisou de muitas actuações para se afirmar, veementemente, no cenário local e a prova é que, realmente, a banda tem continuado a crescer e está num nível de topo para o que se pratica na região. O colectivo comandado por Petr Labrenstev [guitarra] e Gualter Couto [bateria] colocou em palco, sem mácula, toda a sua entrega, destreza e talento frente a um público que não perdeu um segundo para “viver” aquele momento e apoiar um projecto que é já um dos maiores casos de sucesso do metal na região. Complexidade, técnica, melodia e muito profissionalismo na forma de tocar marcam o death/doom metal destes ribeiragrandenses que bebem inspiração em bandas como Death, Carcass e My Dying Bride. Com o ambiente propício, notou-se ainda que os próprios músicos estavam mais soltos, enquanto que o público, mais uma vez realçamos, rendeu-se ao seu concerto naquele que foi um dos melhores momentos de todo o festival.

A acarretar quase dez anos de experiência e um estatuto que se lhes impõe que seja preservado em cada aparição ou trabalho discográfico, os In Peccatum juntaram-se a esse ambiente deveras acolhedor e contagiante para arrancar para uma actuação que o próprio António Neves [voz, guitarra] considerou várias vezes como “o melhor concerto de sempre” da banda. Isto não porque a banda esteve excepcionalmente bem, mas porque o público – mais um vez refiro e já agora acrescento que esta era a surpresa de que falava – esteve irrepreensível. O ambiente que o October Loud trouxe acredita-se ser sintomático de que algo está a mudar – para muito melhor! Os grandes concertos ou festivais fazem-se de grandes bandas, mas essenciamente de ambiente e público alegre, unido, extrovertido e, acima de tudo, predisposto a apoiar os projectos. Isto viu-se do princípio ao fim neste primeiro dia do festival, quer com nu, death, black ou doom metal, situação pouco usual por estas bandas já que o público local vem comprovando há tempos que é mais afecto a correntes contemporâneas do metal. Sendo assim, até com os In Peccatvm se viu mosh e ouviram coros de apoio. Quanto à prestação da banda, ficou patente que ganhou força e dimensão com a entrada de um baterista de raiz e um teclista – que aqui até tocou guitarra perante a ausência de Hélder Almeida. Quanto ao resto, a banda esteve ao nível habitual. Revisitou os seus três trabalhos até à data, para surpresa de todos, com “Regnum Lusitaniae”, mesmo com o seu cheiro a “mofo”, a representar um momento emocionante.

Já com os corpos bastante suados devido ao bafo húmido da sala, e após recuperadas algumas energias nas contiguidades do recinto, os black metallers Zymosis encetaram a sua diabólica actuação, mais uma, de novo de forma irrepreensível. Aliás, começa a ser ponto mais que evidente que uma das virtudes da banda é manter-se sempre regular de concerto para concerto, o que neles é bom sinal. O público manteve-se activo, embora já se notasse um ligeiro abrandamento devido ao cansaço, mas ainda assim público e banda estiveram em sintonia. É curioso verificar como uma banda de black metal, que surge deslocada no tempo atendendo à realidade actual do metal açoriano, acabou por agarrar o respeito do público mercê de uma entrega e crença no seu trabalho que são agora reconhecidas por toda a gente. Uns verdadeiros guerreiros. Para além disso, a banda alcançou já algo que é muito importante: temas populares. É novamente curioso verificar como uma de banda de black metal sinfónico como os Zymosis acaba por ter, neste momento, o seu maior hino num tema com cavadas influências folk - “The End Of The Apocalypse”. O lead de piano de Sérgio Botelho, e que é divisa em toda da música, cria euforia aos primeiros instantes. Percebemos já que é um dos temas mais esperados pelo público e o que maior “festa” causa. Cenicamente a banda também esteve ao nível habitual – a figura da “morte” continua a povoar as actuações dos Zymosis. Em suma, o colectivo de S. Roque acabava com chave de ouro um primeiro dia de festival que superava todas as expectativas. Ou melhor… quase todas. Os presentes foram exemplares, mas temos a certeza absoluta que as pouco mais de duzentas pessoas dentro do Salão de S. José, poderiam ter chegado ao dobro com facilidade. No entanto, a nova geração de “putos” que começa a aparecer nos concertos em S. Miguel está a apresentar uma gana e vitalidade que nos fazem crer que a cena local está a entrar numa nova era. Nessa perspectiva, a qualidade compensa a quantidade.

Texto:
Nuno Costa
Fotografia: Rui Melo [www.metalicidio.com]
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